“O nosso corpo também se torna outro para outros: cada um nasce objecto capitalizado, imagem de alguém; cada um nasce outro, radicalmente outro. Nascemos para sermos, antes de mais, essa coisa fora do comércio vulgar e que, antes de ser nomeada e de tentar viver a sua própria parte de sujeito, começa por ser a parte plena e inteira dos outros, esses outros privilegiados, os pais – literalmente os reprodutores -, confrontados com o objecto desconhecido do seu desejo, com o inatingível de uma transmissão”.
Pierre Legendre em L’Inestimable objet de la transmission
Perfil Perdido é uma peça de Marco Martins sobre filiação e a figura do pai, criada para dois intérpretes e uma voz. Partindo da representação da figura do pai enquanto elemento central da arte ocidental e da domesticidade enquanto estaleiro, os dois protagonistas percorrem a vida de várias personagens, outros eus, criando relações e cruzamentos inesperados- não têm idade nem género ou corpo definido, transmutam-se entre si, criando mundos fugazes e fragmentados.
Na gíria da história de arte, Perfil Perdido alude um retrato a ¾, em que o rosto não se vê mas é convocado, em que atenção é focada naquilo que, não sendo explícito, é indiciado como fundamental. Assim parece acontecer muitas vezes no âmbito da família, imbrincado reduto do mais ancestral e problemático que há em nós, onde se joga em alta parada o (des)equilíbrio entre o indivíduo e o colectivo, entre o interesse pessoal e o bem comum.
Ao convocar um trabalho de improvisação que tem como base o fluxo de memórias pessoais de Beatriz Batarda e Romeu Runa, Marco Martins cria um espectáculo em que os vários excertos de textos usados- que constituem a sua matriz dramatúrgica- são assim simultaneamente uma reconstrução, mais ou menos verdadeira ou falsa da biografia dos seus intérpretes, do que foi vivido ou talvez fantasiado, e também testemunhos directos de outros autores – como Kafka, Bacon, Sófocles, Siri Hustvedt, Peter Kubelka ou Édouard Louis – sobre as suas relações com a autoridade paternal.
Construído ao longo de um ano de residências, Perfil Perdido é um trabalho em constante mutação, que agora continua a sua existência e transformação.
encenação Marco Martins
textos Francis Bacon, Julian Barnes, Sophie Calle, Siri Hustvedt, Franz Kafka, Édouard Louis, Peter Kubelka, Sylvia Plath, Richard Tuttle, Sófocles, William Shakespeare, George Steiner, Manuel Vilas e Slavoj Zizek
com Beatriz Batarda, Romeu Runa
sonoplastia Tiago Cerqueira
cenografia Fernando Ribeiro
desenho de luz Nuno Meira
assistência de desenho de luz Ricardo Campos
Desenho de som Sérgio Milhano
Assistência de desenho de som Tomé Silva
figurino Teresa Pavão
assistência de encenação Rita Quelhas
apoio aos ensaios Hugo Cabral Mendes, Rui Catalão, Vânia Rovisco, Victor Hugo Pontes
consultoria ilusionismo Hélder Guimarães
consultoria sapateado Marinela Mangueira
administração Arena Ensemble Marta Delgado Martins
assistência à produção Margarida Silva
direção de produção Mariana Brandão
classificação etária M/14
duração 1h30
anteestreia 28 de Novembro de 2019, Festival Internacional de Teatro de Istambul
co-produção S. Luiz Teatro Municipal, Teatro Nacional S. João, Centro Cultural Vila Flor, Cine-Teatro Louletano
com o apoio financeiro da República Portuguesa - Ministério da Cultura / Direcção- Geral das Artes
residências Artísticas dVIR/CAPa, Cine-Teatro Louletano, CENTQUATRE, PARIS, O Espaço do Tempo
apoio Artworks
agradecimentos Ministério dos Filmes, Pro.Dança, Alliance Française Lisbonne, Pensão Favorita Porto, Adriano Filipe Silva, Leonor Sassetti Paes
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